E o moribundo não se mexeu


Certo homem descia de Jerusalém para Jerico, quando foi assaltado, e surrado, e deixado para morrer, na beira da estrada.

Ele era sacerdote. Todos os sacerdotes e levitas o conheciam.

Jerico era o seu campo missionário, mas, naquele dia, ele foi impedido de chegar lá. E tudo indicava que jamais chegaria.

Casualmente, outro sacerdote descia de Jerusalém para Jerico. Tudo indicava que o sacerdote, em estado moribundo, estava salvo.

O outro sacerdote o reconheceu, mas evitou se envolver... O moribundo era tido como um bom sacerdote, mas, pensou o outro, essas coisas não deveriam acontecer a bons sacerdotes, logo, deve ter alguma coisa errada com ele. Mesmo assim, parou, mas, a distância... Se ele se mexer ou esboçar qualquer pedido de ajuda... Ajudo.

E o moribundo não se mexeu.

Nisso chega um levita, reconhece o sacerdote moribundo, todos o conheciam; conversa com o outro sacerdote, sobre o que poderia ter acontecido com tão bom sacerdote, ao que o outro sacerdote retruca, dizendo que, talvez ele não fosse tão bom sacerdote assim! Quem sabe o que teria acontecido? E sugeriu o que o levita o acompanhasse na observação... Se o moribundo se mexesse ou esboçasse qualquer pedido de ajuda... Ajudariam.

E o moribundo não se mexeu...

E eles se foram, comentando como as aparências enganam... As vezes a gente pensa que está diante de um grande sacerdote, e, sem o saber, está diante de uma vida cheia de complicações, que acaba por expor-se desnecessariamente, e aí, o inevitável acontece: é derrotado.

De fato, aquele sacerdote, deixado à própria sorte, era conhecido por sua fibra, já havia passado por poucas e boas, e resistido, não fazia sentido vê-lo em tal estado. A dupla de religiosos, também comentava isso. O que eles não sabiam é que o tal sacerdote, a exemplo do herói escocês, William Wallace, na versão cinematográfica Brave Heart, de Mel Gibson, fora atacado, e surrado, e deixado para morrer, por um amigo. William Wallace fora atacado, quando intentava contra o Rei da Inglaterra, Eduardo I, por Robert de Bruce, nobre que Wallace queria ver Rei, mas, que o traiu. O sacerdote, também, enquanto lutava contra o rei da maldade, um amigo o traiu.

O amor é mais forte do que a morte, mas, quando a morte coopta um amigo como seu agente, o amor frustado tira todo desejo de lutar pela vida.

E, por isso, o moribundo não se mexeu.

E veio um samaritano... Ele não sabia do sacerdote, apenas condoeu-se ao ver um homem à beira da morte, e correu para socorrê-lo. Chamou-o para atividades que não tinham a ver diretamente com a sua fé, mas que lhe permitiam vivê-la e anunciá-la. E ele desistiu do sacerdócio, embora, mantivesse sua fé e sua vida na comunidade. Mas ele não queria mais estar no mundo dos sacerdotes.

Entendeu que nessa nova ordem sacerdotal não havia espaço para a simples amizade.

Para essa nova ordem, ser amigo é arriscar-se muito.

Bem, essa verdade é milenar: ser amigo é arriscar-se!

Porém, na nova ordem, ninguém quer correr risco.

Todos estão prevenidos: é melhor evitar do que remediar.

A dupla religiosa que o havia deixado ao largo, comentou o fato com outros religiosos, eles, amigos, ainda que com alguma dor, resolveram, também, evitá-lo.

Parece que alguns sacerdotes estão repensando, mas, pode ser muito tarde, o nosso sacerdote está cada vez mais propenso a só andar com samaritanos.

Por: Ariovaldo Ramos


Um remédio chamado hipocrisia

João Batista era um tipo de profeta enfático e duro com as palavras. E tais palavras, obviamente, incomodavam e despertavam 3 tipos de reações. Indiferença, ódio e arrependimento. Curiosamente não há muitas referências aos indiferentes na narrativa dos evangelhos. Estes eram considerados simplesmente como “as ovelhas perdidas da casa de Israel”. Já os que odiavam os discursos do profeta, ah… estes possuem participação ativa na história; e possuem um lugar “bem quentinho” reservado na eternidade. Mas o grupo que mais se assemelha aos cristãos do presente século é o terceiro tipo. Pessoas arrependidas… que podem não ser necessariamente salvas.
A expressão utilizada por João para confrontar a tais pessoas era “raça de víboras”. Particularmente considero esta expressão muito mais dura do que o “idiota” que usei recentemente em alguns textos e, por isso, recebi trocentas mensagens de repúdio ao meu linguajar. Mas voltando ao assunto… parece que o texto bíblico não se importa com a dureza do profeta. Afinal, todo aquele povo não passava de um bando de cobras. Bicho bonitinho… e traiçoeiro.
O motivo pelo qual os arrependidos daquela época foram confrontados é bem simples. Faziam questão de batizar-se mediante a confissão de seus pecados. E, voltando à realidade de suas vidas egoístas e totalmente longe dos preceitos da justiça de Deus, necessitavam retornar ao rio Jordão para novamente serem batizados mediante a demonstração de arrependimento.
Como João Batista não era besta, ferozmente alertou àquelas pessoas que a única maneira de fugirem definitivamente da ira vindoura era PRODUZINDO FRUTOS DIGNOS DE ARREPENDIMENTO.
E eis a questão que continua a soar como condenação a toda uma geração.
Mudamos a figura do profeta pelo pastor do domingo. E semana após semana, o arrependido recebe a oração em um momento de grande contrição. Pena que, devido à ausência dos frutos de arrependimento, nem o infinito de orações de fim de culto serão capazes de transformar este pecador safado em um pecador genuinamente salvo.
E, obviamente, se temos que lidar com uma geração contaminada com tais preceitos, quem serãos os responsáveis senão nós mesmos que semeamos as devidas sementes equivocadas?
Somos os mestres em ouvir discursos maravilhosos, concedidos aos nossos ouvidos através das palavras de tantos homens em nossa geração. E como as coisas mudaram! Há dúzias de bons cristãos, gritando a verdade das mais diversas maneiras.
Mas preferimos continuar em nossa caminhada mesquinha e egoísta. Passando na drogaria mais próxima antes de cada momento de confronto; adquirindo e se entorpecendo com o remédio chamado hipocrisia. Pois só assim conseguiremos aplaudir aos homens de Deus; e em seguida voltarmos aos nossos próprios interesses.

Pregadores da minha geração… gritem!

Cristãos genuínos que aindao respiram… procurem uma maneira da verdade transformar-se em FRUTOS DIGNOS.

É nossa responsabilidade.

“Mas dirá alguém: Tu tens fé, e eu tenho obras; mostra-me a tua fé sem as obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras.” (Tiago 2:18)

Por Ariovaldo Jr.


Quando as máscaras caem...
Hermes C. Fernandes


Estamos a poucos dias do Carnaval, a festa da carne. Geralmente, acredita-se que é durante esta festa pagã que as pessoas se encondem atrás de máscaras e fantasias. Porém, acredito que o contrário é que se sucede.
Durante os dias de folia, as pessoas tiram as máscaras usadas durante todo o ano, liberando seus desejos ocultos, e revelando suas mais arrojadas fantasias. Por alguns dias, o chefe de família remove a máscara de autoridade, e cai na gandaia. A dona de casa reclusa e tímida se desfaz do papel que representa e se solta na avenida.
Como dizia o Tim Maia, vale tudo! Tudo em nome do prazer, da alegria, ainda que ao término da festa só sobrem cinzas. O problema não é o Carnaval em si, enquanto festa popular (mesmo que sua origem remonte os bacanais e saturnais romanos). O problema é a natureza humana corrompida. O que o Carnaval oferece é o ambiente propício para que esta natureza se revele sem qualquer pudor.
Sinceramente, o que mais me incomoda não são as serpentinas, lantejolas, pouca ou nenhuma roupa dos foliões. O que mais me incomoda são as máscaras usadas ao longo do ano. Há pessoas que conseguem viver mascaradas por anos, sem que ninguém perceba sua hipocrisia. Porém um dia, por descuido, a máscara cai.
São Paulo diz que para que sejamos transformados pelo Espírito de Deus, temos remover o véu que cobre nossa face, e nos expor tal qual somos.
A religião é uma fábrica de máscaras. Pior do que os bate-bolas das ruas, são os bate-bolas dos púlpitos. Aqueles que cativam as pessoas pelo medo, pelo terror.
Deus, porém, conhece a pessoa por trás da fantasia. Ele não se impressiona com nossa atuação, quando fazemos do púlpito nosso tablado. Ele sabe exatamente as intenções por trás daquela voz grave, do emocionalismo barato, do sensacionalismo canibal.
Nenhum cristão está autorizado por Deus a julgar foliões. Em vez de dedos a riste, estendamos as mãos, e apresentemos a eles uma alegria que nunca termina, e que jamais resultará em cinzas.

"Venha como você está"

“Os ímpios serão lançados no inferno, e todas as nações que se esquecem de Deus.” (Salmos 9:17) Os estudiosos e sociólogos dizem que hoje nós vivemos num período de experiência pós-moderna. De fato, convivemos com tecnologia avançada, globalização, comodismo (em todos os aspectos), e por aí se faz uma grande lista que, talvez amanhã já deva ser atualizada. Mas se pararmos pra pensar, como vivemos, pensamos e agimos hoje é, nada mais, nada menos, do que um seqüela da maluquice cultural e histórica que explodiu em nosso país, especialmente nas décadas de 60 e 70. Vou explicar…
Nos anos 40, em torno de 70 % dos brasileiros moravam na área rural, não havia sequer uma indústria de automóvel e as residências ainda não tinham televisão. A família brasileira era extremamente tradicional e conservadora. O desquite era motivo de preconceitos e vergonha. O racismo não era motivo de debates, porque o negro brasileiro não desenvolvia movimentos sociais.
A estrutura social era marcada pelo coronelismo. Nos anos 50, a liberdade começou a ser idealizada, pelo menos politicamente falando. A população deixava os campos e migrava para as grandes cidades e nelas se desenvolvia as artes, o turismo, a indústria naval e o petróleo. Quanto à família, ela ainda continuava tradicional e o seu padrão comportamental era ter filhos. Já os anos 60, foram anos de muita agitação, de liberdade, da descoberta da pílula anticoncepcional. Anos do movimento hippie. Embora a década de 60 ter sido para o Brasil, anos de ditadura e de censura, por conta do golpe militar, houve certa movimentação cultural e musical com a Jovem Guarda, a MPB e o Tropicalismo. E, por fim, falando da década de 70, anos estes em que as músicas exaltavam o país, tais como “este é um país que vai pra frente e ninguém segura a juventude do Brasil”.
O futebol esteve também em pauta contribuindo para a alienação do povo (não sou contra o futebol, mas naquela época o esporte serviu de escape para as grandes transformações e crises enfrentadas pelo país). Depois das torturas, dos exílios, de tantas prisões, e censura os anos 70 também vivenciaram o fim do Regime Militar e o ressurgimento dos movimentos sociais. Foi também nessa época em que se instalou o caos familiar e os crescentes índices de divórcio. A descoberta sexual na adolescência significou o amor livre no fim dos anos 70, o herpes em 1980 e a AIDS em 1990. Mas pra quê tantas informações históricas? Agora sim, vou dizer onde quero chegar. Se a Igreja está alcançando pessoas comuns com menos de 40 anos, então é muito provável que: uma em cada três mulheres tenha feito um aborto.
Uma ou até duas em cada seis podem ter sido abusadas sexualmente. Mais de seis dentre dez pessoas pensam que viver junto, em vez de casar, é uma maneira inteligente de evitar o divórcio, e cinco dentre essas dez pessoas já viveram com alguém. A maior parte é sexualmente ativa. E a grande maioria dos homens deve lutar contra a pornografia ou problemas sérios em relação à luxúria. Uma em cada cinco a dez pessoas luta contra o uso excessivo de drogas ou álcool. E pelo menos uma, e até duas, em cada cinco talvez fume. Resumindo: se a Igreja pretende trabalhar com a nova geração, então ela precisa criar uma cultura onde pessoas totalmente desajustadas sejam bem-vindas! Isso é um fato! Todas essas mudanças históricas e, principalmente de comportamento criaram uma CULTURA DE SOLIDÃO, onde as pessoas estão totalmente CARENTES DE RELACIONAMENTOS GENUÍNOS.
As pessoas almejam hoje, como nunca antes almejaram estar em família, pois ela representa o autêntico apoio relacional para qualquer ser humano. E o desafio para a Igreja do século XXI é exatamente esse: deixar de ser uma “igreja para visitantes” e passar a funcionar como uma família, um corpo bem ajustado, assim como ordena a Bíblia. Estratégias como boa música, teatro, cafezinhos são importantes sim, e até atraem muitas pessoas, mas tem pouca relação com o culto em si, pois mantê-las em unidade e levá-las até Cristo são responsabilidades que Deus deu a nós. Não há desafio e oportunidade maiores para a Igreja do que lidar com os esmagadores sofrimentos emocionais que conduzem nossa geração. É responsabilidade nossa criar uma nova cultura do tipo “venha como você está”. As pessoas não resistem à verdade; elas resistem à arrogância! Por isso devemos ser sábios e muito amorosos ao representar o Corpo de Cristo no mundo.

Kênia Siqueira